(Divulgação/Globo) |
"O impacto é enorme, especialmente do ponto de vista jornalística, né... É um aprendizado, na prática, sem precedentes. Sem precedentes... Certamente que também é um aprendizado de vida. Para um 'moleque', que estava ali no início de carreira. Eu sempre fui meio 'pé no chão', mas você se deparar com um fim de semana que 'vitimou' Rubinho [Barrichello, que estava na Jordan e sofreu forte acidente no treino livre para a corrida] gravemente na sexta-feira..."."
"O Rubinho inclusive não participou da corrida. É uma corrida que o Rubinho conta, mas não larga. Mas a gente estava em Ímola e serve como lição. O maior ídolo do esporte brasileiro àquela altura [Senna] morre trabalhando. E no sábado morre o [Roland] Ratzenberger. Eu me lembro da batida do Ratzenberger. Ele bate, ricocheteia e gira. E ele [Ratzenberger] já está com a cabeça tombada e você via na lateral o joelho do piloto."
"Arranca a lateral do carro e eu falei: 'Não é possível, o cara morreu'. Desde o Riccardo Paletti no Canadá [em 1982] que não tinha morte na F1. A gente estava meio desabituado com isso. E aí no domingo [...] está todo mundo meio que com a emoção à flor da pele com aqueles dois acidentes graves na memória. Acaba o briefing (reunião pré-corrida) e a gente acompanha o Senna. Ele entra no box da Williams e bota as duas mãos sobre as asas do carro."
"E ele deu uma declaração para a gente ali, falando que tinha sido recriada a GPDA (Associação dos Pilotos de GPs da F1, órgão de representação dos competidores da categoria máxima do automobilismo do mundial). É a última imagem que eu tenho do Ayrton Senna vivo. Dali a gente vai para a cabine de transmissão e na verdade eu não vejo mais o Senna. Eu vejo o Senna com o corpo coberto quando o corpo saiu do hospital Maggiore."
"E eu estava com um celular com roaming internacional, que era uma novidade. Então entrevistei o Rubinho de dentro da UTI e entrevistei o Senna saindo do hospital da pista depois da batida de Rubinho. E os colegas davam preferência porque eu estava ao vivo. Na hora que anunciam que o Ayrton Senna morreu eu sou o único ao vivo, por sorte. Anunciaram a morte e eu fiz 'um vivo' grande de repercussão e tal. Depois fui tentar me entender com a situação."
"'O Senna morreu, meu deus, o que que eu faço aqui? O que que eu tenho que fazer? Ou quem que eu tenho que entrevistar?' E aí chegou um diplomata e ele disse: 'O corpo vai ter que ir para o Instituto Médico Legal (IML), que fica perto daqui, por uma questão da legislação italiana. Mas o corpo neste momento está lá no 12º andar, onde fica a UTI'. E aí nós subimos e eu faço uma entrevista com o Galvão Bueno."
"Eu vou para um 'orelhão' e entrevisto o Galvão Bueno ao vivo na Rádio Globo de São Paulo. Eu faço algumas entrevistas para o Galvão e ele me diz: 'Nesse fim de semana, especialmente depois dos acidentes de sexta e sábado, o Ayrton entendeu que ele estava muito grande. Ele parece que entendeu que ele é o grande desse circo. Que ele precisa ter liderança, então é inacreditável que isso tenha acontecido'."
"O Senna tinha mudado o patamar dele. Ele tinha deixado de ser só um campeão para ser um gigante da história do esporte como liderança. E aí entro na Rádio Globo do Rio e me falam: 'Neste momento, o Maracanã [que recebia o clássico entre Vasco e Flamengo] inteiro grita Senna'. Do outro lado, eu quase desabei, porque eu só fui desabar mais para frente", revelou o emocionado Luis Roberto.
"Quando termino a entrevista com Galvão para a Rádio Globo do Rio, neste momento o corpo do Senna está sendo tirado da UTI na maca, coberto por um lençol. Tinha uma mancha de sangue na altura do nariz. Aí a gente foi para a porta do IML. Ali, muita gente... Torcida, buquês de flores, coroa, japoneses, inglês, chinês, gente de tudo quanto é canto do mundo. E quando foi umas 5 da manhã, o portal lateral se abriu, porque iria ter a troca de plantão."
"Entrou um carro e a gente entrou... Jornalista, a gente entrou... Quando abriu a porta lá do fundo do IML saiu uma senhora. E ela pergunta: 'Vocês querem olhar [para o corpo de Senna]?'. E a gente olhou um para a cara do outro e: 'Não'. Tem uns colegas jornalistas que acham que 'tinha que ter ido ver'. Não! Ela falou: 'Tem um ferimento no rosto e a cabeça está inchada. E ao lado está o corpo do Roland Ratzenberger'. É muito forte...".
Um dia voltei da rua e aí tinha um guardanapo escrito: 'Voo Varig Paris-Brasil tal dia e tal hora'. Era o Galvão, ele tinha deixado no meu escaninho a informação de qual seria o voo. Consegui um lugar no voo. A gente viu o caixão embarcado numa aeronave pequena em Bolonha. Em Paris, acompanhamos o traslado, a gente sabia que a urna seria embarcada. A Varig tirou a classe executiva e fixou o caixão na classe executiva, com uma lona e uma rosa."
"Ao lado do caixão estavam o Galvão, o irmão do Ayrton... No meio da madrugada, o Galvão nos chamou para a gente fazer uma despedida. Fizemos, cada um com sua fé, uma reza. Aí quando chegamos em São Paulo, a gente ficou no ônibus esperando o desembarque [do caixão]. Já também, com honras de herói. E foi a última vez que eu tive o corpo do Ayrton Senna por perto e depois não fui ao enterro, fiquei muito mal. Cheguei em casa e desabei. Não conseguia fazer mais nada, só chorava, processando o que tinha acontecido".
Assim como outros grandes profissionais e desportistas, concordo que o Senna era um gênio, sem sombras de dúvidas o melhor da epoca no que fazia, levando porque não diversão e lazer para os que assistiam as corridas, mas chamar um chutador de bola ou piloto de carro de herói mostra a minúscula intelectualidade do brasileiro. Tem gente que salva vidas, arrisca a deles pela dos outros, está certo que recebem pra isso, mas correm o risco e não são reconhecidos, nem pelo trabalho e nem na questão de salário, ai na contramão disso, chamar um piloto que ganha $$$$$$$ pra correr ou um cara q ganha $$$$$$$$ pra jogar bola de herói, sem noção.
ResponderExcluirPéssimo narrador!
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